segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

Penpal: Balões

Está série me proporcionou uma ótima experiência, me fez se aprofundar na narrativa, e vivenciar a história ao ponto de perder o fôlego lendo, e então, decidi compartilhar ela com vocês aqui no blog. Esta história foi postada originalmente no Reddit por um usuário chamado "1000Vultures", porém a li em outro blog ao qual admiro bastante, o Creepypasta Brasil, e a tradução das histórias foram realizados pelos administradores de tal blog. Dou crédito especial a Divina Lopes, ao qual traduziu praticamente toda a série. Esta é a segunda de seis histórias escritas pelo mesmo autor, se você ainda não leu a primeira clique aqui, desejo uma ótima leitura.

[...]

Alguns dias atrás postei uma história chamada "Passos". Houve algumas  perguntas que me fez ficar curioso a respeito da minha infância, então fui conversar com minha mãe. Alarmada por minhas perguntas, disse "Por que não conta para eles sobre os malditos balões, se estão tão interessados?" No momento em que ouvi essas palavras, lembrei mais do que esperava. Esta história fará com que a anterior tenha mais nexo, mas acho melhor você ler a outra primeiro. Embora a ordem não seja de importância vital, lendo aquela primeiro fará com que você se ponha melhor no meu lugar, sendo que acho que os eventos da "Passos" aconteceram antes.  Ah, e um aviso prévio: As duas histórias são longas. Não quero deixar nenhum detalhe que possa ser importante de fora.

Quando eu tinha cinco anos de idade eu frequentava uma escolinha que, pelo o que me parece agora, era totalmente inflexível sobre a importância do aprendizado com atividades. Era parte de um novo programa desenvolvido para que as crianças evoluíssem no seu próprio ritmo e, para facilitar isso, a escola encorajava os professores a serem bastante criativos em suas aulas. Cada professor ou professora tinha a liberdade de criar seus próprios temas que seriam a base durante todo o semestre,  e todas as atividades de matemática, leitura, e outros seriam feitas dentro do tema. Esses temas eram chamados de "Grupos". Havia o grupo do "Espaço", do "Mar", da "Terra" e o grupo em que eu estava, "Comunidade".

No país onde eu moro, você não aprende muito no Jardim de Infância. Nada muito além de amarrar os cadarços e compartilhar, então geralmente não tem coisas de importância para se lembrar dessa época. Eu, por exemplo, só lembro de duas coisas: Eu era o melhor em escrever meu nome corretamente e o Projeto dos Balões, que foi a marca registrada do Grupo Comunidade, sendo que é um jeito simples de mostrar basicamente como funciona uma comunidade em si.

Provavelmente você já ouviu falar sobre essa atividade. Em uma sexta-feira (sei que era sexta porque estava muito empolgado para esse projeto, e lembro de ter de esperar toda a semana), no começo do ano, entramos na sala de aula e encontramos balões cheio de gás hélio amarrados com uma cordinha em cada uma das mesas. Junto havia uma caneta permanente, uma caneta, um pedaço de papel e um envelope. O projeto consistia em escrever um textinho, colocar no envelope, amarrar na corda e desenhar qualquer coisa que quiséssemos na superfície do balão. A maioria das crianças começaram a brigar pelas diferentes cores dos balões, mas eu comecei de imediato escrever a cartinha, na qual tinha pensado muito nos dias anteriores.

Todas cartinhas tinham que seguir uma estrutura especifica, mas fomos autorizados a ser o mais criativos possíveis dentro desse limite. O meu texto era mais ou menos assim "Olá! Você encontrou meu balão! Meu nome é [Nome] e estudo na Jardim de Infância XXXXXXXXX. Você pode ficar com o balão, mas espero que me escreva de volta! Gosto de desenho animado, explorar, construir fortes, nadar e fazer amigos. O que você gosta? Me escreva logo. Aqui está um dólar para o correio!" Na nota escrevi "PARA SELOS" bem na frente, o que minha mãe disse não ser necessário, mas achei uma genialidade da minha parte.

A professora tirou com uma  Polaroid fotos de cada aluno junto de seu balão e nos fez colocar dentro do envelope, com nossa cartinha. A professora colocou outra carta, que provavelmente explicava a natureza do projeto e sinceros apreços à quem respondesse e mandasse junto uma foto de sua cidade ou vizinhança. Essa era a ideia - construir um senso de comunidade sem ter que sair da escola e estabelecer um contato seguro com outra pessoa; parecia ser uma ideia tão divertida...

Durante as semanas seguintes as castas começaram a chegar. A maioria vinha com uma foto de uma paisagem diferente e, toda vez que uma carta chegava, a professora fixava a foto em um grande quadro, mostrando de onde tinha vindo e o quão longe o balão tinha viajado.  Foi uma ideia muito inteligente, porque estávamos sempre animados para ir à aula, querendo saber se nossa carta tinha chego. Durante todo o ano, uma vez por semana tínhamos o direito de escrever de volta para nosso amigo da carta ou para o amigo da carta de um dos nossos colegas, caso não tivéssemos recebido a nossa ainda. A minha foi uma das últimas a chegar. Quando cheguei na sala olhei para minha mesa e mais uma vez vi que não havia nenhuma carta esperando por mim. Mas, quando sentei, a professora me entregou um envelope. Devo ter parecido animado demais porque quando estava prestes a abrir, ela colocou a mão em cima da minha e disse "Por favor, não fique chateado". Não entendi o que queria dizer com isso - Por que eu iria ficar triste se minha carta tinha finalmente chegado? Inicialmente achei um mistério como ela sabia o que estava no envelope, mas agora percebo que era óbvio que a professora verificava cada uma das cartas para ter certeza que não continha nada obseno, mas mesmo assim - Como eu poderia ficar desapontado? Quando abri o envelope, entendi.

Não havia carta nenhuma.

A única coisa dentro da carta era uma foto Polaroid, mas não dava para identificar o que era. Parecia um pedaço do deserto, mas estava muito desfocada para decifrar; era como se a câmera tivesse sido movida enquanto a foto estava sendo tirada. Não havia endereço que eu pudesse escrever de volta. Fique arrasado.

O ano escolar foi passando, e as cartas pararam de chegar para quase todos os alunos. Afinal, você não tem muito o que ficar escrevendo para uma criança por tanto tempo. Todo mundo, incluindo eu, tinha perdido quase que totalmente o interesse nas cartas. Então recebi outro envelope.

Minha animação foi rejuvenescida, e me alegrava com o fato que ainda estava recebendo cartas enquanto o resto dos alunos tinha sido abandonados por seus amigos de carta. Fazia sentido que eu recebesse outra - não havia nada mais do que uma foto desfocada na primeira, então essa provavelmente era para compensar a outra. Mas, novamente não havia carta.. Apenas outra foto:

Essa era menos borrada, mas ainda assim não conseguia entender. A foto mostrava um pedaço do topo de um prédio e o resto da imagem estava distorcida pela luz do sol.

Por conta dos balões não viajaram tão longe, e por terem sido lançados no mesmo dia, o quadro de fotos tinha ficado muito cheio, então os alunos que ainda estavam recebendo cartas, agora podiam levar as fotografias para casa. Meu melhor amigo Josh foi o segundo aluno com mais fotos levadas para casa até o final do ano - seu amigo de carta era bastante cooperativo e mandou fotografias de toda a vizinhança para ele; Josh levou, acho, quatro.

Eu levei mais ou menos cinquenta.

Os envelopes eram sempre abertos pela professora antes de ser entregue a mim, mas depois de um tempo eu nem via mais as fotos. Entretanto, guardava  em uma das minhas gavetas que abrigava minha coleção de pedras, cartões de baseball, figurinhas de histórias em quadrinho e pequenas miniaturas de tacos e capacetes de baseball. Com o fim do ano letivo, minha atenção voltou-se para outras coisas.


Minha mãe tinha comprado uma maquina de Raspadinha (N.T: Na história original é usado o termoSnow Cone, que é basicamente gelo raspado com suco) no Natal passado, e Josh realmente cobiçava isso - tanto que seus pais compraram uma maquina melhor de aniversário para ele no final do ano. Naquele verão tivemos a ideia de montar uma barraca de Raspadinha para vender; achamos que faríamos uma fortuna vendendo cada um por um dólar. Josh mora em um bairro diferente, mas eventualmente decidimos que o meu bairro seria melhor por ser maior. Fizemos isso por cinco semanas direto até que minha mãe me disse que tínhamos de parar, e só recentemente entendo por que ela fez isso.

No fim do dia de Domingo da quinta semana, Josh e eu estávamos contando nosso dinheiro. Tínhamos cada um uma máquina, e fazíamos dinheiro separados. Mas no final juntávamos tudo e dividíamos uniformemente. Tínhamos feito um total de 16 dólares naquele dia, e enquanto Josh me alcançava meu último dólar, um sentimento de surpresa profunda me consumiu.

Estava escrito "PARA SELOS" no dólar.

Josh notou meu choque e perguntou se tinha contado errado. Contei sobre o dólar e ele disse "Que demais, cara!" Enquanto pensava, concordei. A ideia que o dólar tinha voltado para mim depois de ter passado por tantas mãos me deixou atordoado.

Corri para dentro de casa para falar com minha mãe, mas minha empolgação juntamente de sua distração por causa de um telefonema que fazia no momento fez com que minha história ficasse meio incompreensível, e apenas respondeu "Uau! Muito legal!"

Frustrado, corri de novo para fora e disse à Josh que tinha algo para lhe mostrar. De volta ao meu quarto, abri a gaveta e peguei o maço de envelopes e mostrei algumas das fotos. Comecei com a primeira, e vimos mais umas dez até Josh perder o interesse e perguntar se eu queria brincar na trincheira (uma vala de terra que ficava no final da rua) antes que sua mãe viesse buscá-lo, então foi isso que fizemos.

"Guerreamos" por um tempo, mas fomos interrompidos várias vezes por um farfalhar vindo do bosque ao nosso redor. Haviam guaxinins e gatos de rua que viviam lá, mas era barulho de mais, então ficamos trocando palpites sobre o que era, na tentativa de assustar uns aos outros. Meu último palpite foi que era uma múmia, mas no final Josh continuava insistindo que era um robô, por causa dos sons que estávamos ouvindo. Antes de irmos embora, ele ficou um tanto sério e me olhou nos olhos dizendo, "Você ouviu, né? Parecia um robô. Você também ouviu, né?" Eu tinha ouvido, e tinha soado mecânico, então concordei que provavelmente era um robô. Só agora entendo o que ouvimos naquele dia.

Quando voltamos, a mãe de Josh estava esperando por ele na cozinha com minha mãe. Josh contou para ela sobre o robô; nossas mães riram e Josh foi para casa. Minha mãe e eu jantamos e depois fui para cama.

Não fiquei na cama por muito tempo antes de sair de fininho e decidir que, devido aos acontecimentos do dia, revistaria todos os envelopes, pois agora tudo parecia mais interessante. Peguei o primeiro envelope e coloquei no chão junto com a foto desfocada do deserto bem em cima. Coloquei o segundo envelope do lado do primeiro e coloquei a foto do topo do prédio em cima. Fiz isso com todas as fotos até formar uma grade com cerca de 10x5; Sempre me foi dito para ser cuidadoso com as coisas que colecionava, mesmo que essas não tivessem nenhum valor.

Notei que as fotos iam ficando cada vez mais decifráveis. Havia uma árvore com um pássaro, uma placa de limite de velocidade, poste de luz, um grupo de pessoas andando para dentro de um prédio. E então vi algo que me deixou extremamente angustiado tanto que agora, enquanto escrevo, lembro de me sentir tonto e capaz de apenas repetir uma pergunta mentalmente:

"Por que estou nessa foto?"

Nessa foto do grupo de pessoas entrando no prédio, me vi segurando a mão de minha mãe, bem no fim da multidão. Estávamos na beira da foto, mas inegavelmente éramos nós. E enquanto meus olhos nadavam pelo mar de Polaroids, comecei a ficar muito ansioso. Era um sentimento realmente estranho - não era medo, e sim aquilo que você sente quando está em apuros. Não sei bem por que fui inundado com essa sensação, mas lá estava eu me afogando na ideia que tinha feito algo de errado. E esse sentimento só se intensificou quando olhei para o resto das fotos depois daquela que tinha me atingido poderosamente.

Eu estava em todas as fotos.

Nenhuma delas eram de perto. Nenhuma delas eram só minhas. Mas eu estava em cada uma dela - no lado, no fundo, na parte inferior do quadro. Algumas delas haviam apenas um pequeno pedaço do meu rosto no canto da foto, mas mesmo assim, eu estava lá. Eu sempre estava lá.

Não sabia o que fazer. Nossa mente funciona de um jeito engraçado quando somos crianças, e havia uma grande parte de mim que estava com medo de entrar em apuros apenas por estar acordado aquela hora. Sendo que eu já estava me sentido ameaçado pela sensação de ter feito algo errado, decidi que esperaria até o amanhecer.

No dia seguinte, minha mãe estava de folga do trabalho e passou maior parte da manhã limpando a casa. Assisti desenhos animados, acho, e esperei até um momento que achasse apropriado para mostrar à ela as Polaroids. Quando ela foi buscar a correspondência, peguei algumas das fotos e coloquei em cima da mesa em minha frente enquanto esperava que ela voltasse. Quando entrou em casa, já estava abrindo as correspondências e jogou algumas fora e eu disse:

"Mãe, você pode vir aqui por favor? Tenho essas fotos..."

"Só um minuto, querido. Tenho que marcar isso no calendário."

Depois de um minuto ou dois, ela meio até mim e ficou atrás da minha cadeira e perguntou o que eu queria. Conseguia ainda ouvir ela ainda mexendo com a correspondência, mas fiquei apenas olhando as Polaroids enquanto contava tudo para ela. Enquanto explicava e apontava para as fotos, os "unhuns" e os "oks" dela fora diminuindo, e de repente estava totalmente calada e não mexia mais com as cartas. A próxima coisa que ouvi era como se ela estivesse tentando respirar em um lugar que não tivesse oxigênio. Por fim ela estava arfando e simplesmente jogou o restante da correspondência em cima da mesa e correu até a cozinha em direção ao telefone.

"Mamãe! Desculpa, eu não sabia disso! Não fique brava comigo!"

Com o telefone pressionado contra o ouvido ela andava/corria para frente e para trás enquanto gritava. Comecei a mexer nervosamente com a correspondência enquanto observa-a. Da abertura da carta que estava no topo da pilha estava saindo um pedaço de algo, que puxei sem pensar.

Era outra Polaroid.

Confuso,  achei que uma de minhas Polaroids tinha, de certa forma, entrado dentro de um desses envelopes quando mamãe tinha jogado-as na mesa, mas quando virei e olhei, percebi que nunca tinha visto esta antes. Para aumentar meu medo, era eu, mas esse era uma fotografia tirada de muito mais perto. Eu estava cercado de árvores e estava sorrindo. Mas não estava sozinho, notei. Josh estava comigo. Essa foto era de ontem.

Comecei a gritar pela minha mãe que ainda estava gritando no telefone. Gritei repetidamente por ela até que respondeu com um "O que?!" e a única coisa que consegui perguntar foi "Para quem você está ligando?"
"Estou falando com a polícia, querido."
"Mas porque? Me desculpa, eu não queria ter feito nada..."

Ela me respondeu com algo que nunca entendi até que me forcei a relembrar desses momentos da minha infância. Ela pegou a foto da mesa e viu a nova Polaroid e colocou junto com as outras. Segurou  o envelope na frente do meu rosto mas eu estava olhando para o rosto dela, que ia perdendo a cor a cada momento que passava. Com lágrimas nos olhos, disse que tinha que ligar para a polícia porque não havia nenhum carimbo do correio no envelope.

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