segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

Penpal: Mapas

Está série me proporcionou uma ótima experiência, me fez se aprofundar na narrativa, e vivenciar a história ao ponto de perder o fôlego lendo, e então, decidi compartilhar ela com vocês aqui no blog. Esta história foi postada originalmente no Reddit por um usuário chamado "1000Vultures", porém a li em outro blog ao qual admiro bastante, o Creepypasta Brasil, e a tradução das histórias foram realizados pelos administradores de tal blog. Dou crédito especial a Divina Lopes, ao qual traduziu praticamente toda a série. Esta é a quarta de seis histórias escritas pelo mesmo autor, se você ainda não leu a primeira clique aqui, se não leu a segunda clique aqui, se não leu a terceira clique aqui, desejo uma ótima leitura.

[...]

Houve um comentário no último post que me fez lembrar de um evento da minha infância que sempre levei como esquisito, mas nunca tinha considerado-o ser relacionado com nenhuma dessas histórias. Agora sei que é. É engraçado como a memória funciona. Os detalhes podem estar todos presentes em sua mente, entretanto todos desalinhados e dispersos e, em seguida, um único pensamento consegue colocá-los todos de volta quase que instantaneamente. Nunca pensei muito nestes eventos pois estava me focando nos detalhes errados. Voltei para casa de minha mãe e dei uma olhada nos meus antigos trabalhos escolares de quando era criança, procurando por algo que achava ser importante. Não consegui encontrar, mas continuarei procurando. Novamente, desculpe-me pelo comprimento.

Os bairros dentro de cidades antigas não foram planejadas com o pensamento que a população cresceria exponencialmente e que teriam de ser acomodadas. O estilo das estradas são geralmente originadas em resposta as restrições geográficas e a necessidade de conectar pontos econômicos de suma importância. Uma vez que as estradas de conexão são estabelecidas, novos negócios e estradas são posicionadas estrategicamente junto do esqueleto já existente e, eventualmente, as ruas esculpidos em terra são imortalizadas com asfalto, deixando apenas um pequeno espaço para modificações, adições  e alterações; mas nunca há mudanças drásticas.

Dito isso, o bairro da minha infância deve ter sido antigo. Se linhas retas são "como o corvo voa", então meu bairro deve ter sido construído baseado no andar de uma cobra. As primeiras casas devem ter sido construídas em volta do lago e, gradualmente, a área habitável aumentou à medida que novas extensões foram construídas longe dos caminhos originais; mas essas extensões acabavam abruptamente em um ponto ou outro - havia apenas uma entrada/saída para todo o bairro. Muitas destas extensões eram limitadas por algo que eu chamava de "trincheira". A maioria das primeiras casas tinham enormes jardins, mas alguns destes terrenos acabaram por serem divididos, deixando os proprietários com limites cada vez menores. Uma vista aérea do meu bairro daria a impressão que uma lula enorme havia morrido na floresta e algum empresário aventureiro encontrou o cadáver e começou a construir as ruas por cima de seus tentáculos e depois foi embora, e deixou que o tempo, a ganância e o desespero dividisse a terra entre os proprietários numa tentativa constrangedora de Proporção Áurea.

Da minha varanda podia se ver as casas antigas que cercavam o lago, mas a da Sra. Maggie era minha favorita. Ela tinha, pelo que me lembro, uns 80 anos, mas apesar disso ela era uma das pessoas mais amigáveis que já conheci. Ela tinha cabelos brancos que usava em cachos soltos e sempre usava vestidos claros com estampa floral. Ela, de sua varanda, conversava comigo e Josh quando estávamos nadando no lado e sempre nos convidada para fazer um lanche. Dizia ser solitária pois seu marido, Tom, sempre estava fora por causa do trabalho. Mas mesmo assim, Josh e eu sempre recusávamos os convites dela porque, por mais legal que Sra. Maggie era, tinha algo esquisito sobre ela.

De vez em quando, enquanto nadávamos para longe ela dizia "Chris e John, vocês são sempre bem vindos aqui!". E nós continuávamos a ouvi-la gritar mesmo quando já estávamos andando para casa. 

Sra. Maggie, assim como outros donos das casas mais antigas, tinha um sistema de regador automático que era ligado a um temporizados, embora em algum momento ao longo doa anos seu temporizados deve ter quebrado pois os regadores ligavam várias vezes durante o dia e as vezes até noite, durante o ano todo. Embora nunca tenha ficado frio o suficiente para nevar, várias vezes no inverno eu iria até o jardim de Sra. Maggie para ver o paraíso ártico surreal  feito pela água congelada. Todos os outros jardins continuavam secos e isentos do gelo do inverno. Mas lá, bem no meio estava aquele lindo Oasis de gelo que caía com estalactites em todos os galhos de cada árvore e todas as folhas de cada arbusto. Enquanto o sol nascia, este refletia em cada peça de gelo fazendo um incrível arco-íris que só podia ser visto por um breve momento antes de cegar você. Mesmo quando criança, eu ficava impressionado por quão lindo era aquilo e ,regularmente, Josh e eu íamos lá para andar sobre a grama congelada e fazer guerra de espada com pedaços de gelo.

Uma vez perguntei para minha mãe o porquê dela deixar os regadores ligados daquele jeito. Minha mãe pareceu procurar pela resposta certa antes de dizer,

"Bem, querido, Sra. Maggie está muito doente e algumas vezes quando ela fica muito doente, fica confusa. É por isso que as vezes confunde seu nome ou o de Josh.  Ela não tem esta intenção, mas as vezes não consegue se lembrar. Ela vive sozinha naquela casa enorme, então vocês podem conversar com ela quando estiverem nadando no lago. Mas quando ela convidar vocês para entrar, você devia continuar a dizer 'não'. Seja educado; ela não ficará magoada."


"Mas ela ficará menos solitária quando seu marido voltar para casa, certo? Quanto tempo ele ficará longe por causa do trabalho? Parece que ele sempre está longe."

Minha mãe parecia se conter e eu podia perceber que ela estava muito triste. Finalmente, ela respondeu,

"Querido... Tom não irá voltar. Tom está no céu. Ele morreu a muitos e muitos anos atrás, mas a Sra. Maggie não se lembra. Ela fica confusa e se esquece, mas Tom nunca vai voltar para casa. Se alguém se mudasse para a casa dela, provavelmente ela acharia que era Tom, mas ele se foi, querido."


Eu tinha 5 ou 6 anos quando ela me falou isso e, mesmo que não entendesse completamente, fiquei profundamente triste pela Sra. Maggie.

Agora sei que Sra. Maggie tinha Mal de Alzheimer. Ela e seu marido tiveram dois filhos: Chris e John.  Os dois pagavam pelas despesas de Sra. Maggie, como água e eletricidade, mas nunca iam visitá-la. Não sei se algo aconteceu entre ele, se foi a doença ou se eles viviam muito longe, mas eles nunca apareciam por lá. Eu não fazia ideia de como eles se pareciam, mas houve épocas em que a Sra. Maggie deve ter achado que eu e Josh fossemos parecidos com eles quando eram crianças. Ou talvez ela só viu o que uma parte de sua memória queria desesperadamente ver; ignorando as imagens transmitidas por seus nervos ópticos e por um curto período de tempo mostrando o que ela queria ver. Só agora percebo o quão solitária ela era de verdade.

Durante o verão depois que tinha saído do Jardim de Infância, antes dos eventos de "Balões", Josh e eu saímos para vasculhar o bosque perto da minha casa, assim como as valas perto do lago. Sabíamos que o bosque entre nossas casas eram conectados e achamos que seria demais se o lago perto da minha casa fosse conectado com o córrego perto da dele, então resolvemos que tentaríamos descobrir.

Nós iríamos fazer mapas.

O plano era fazer dois mapas separados e, em seguida, combiná-los em um só. Faríamos um mapa explorando a área em volta do córrego perto da casa dele, e fazer outro seguindo a saído do lago. Originalmente, iríamos fazer apenas um, mas então percebemos que não seria possível pois eu já tinha começado a desenhar o mapa da minha área em uma escala tão grande que a rota da casa dele não iria caber. Mantínhamos o mapa do lago na minha casa e o do córrego na casa dele e conectávamos os dois quando passávamos a noite na casa um do outro.

Nas primeiras semanas tudo ocorreu bem. Nós andávamos pelo bosque perto da água e parávamos as vezes para adicionar coisas no mapa e parecia que se encontrariam logo. Não tínhamos nenhum equipamento especial para esse "trabalho" - nem mesmo um compasso - mas tentamos fazê-lo certinho. Tivemos a ideia de enfiar um galho na terra quando parássemos de fazer o mapa no fim de tudo, assim saberíamos o ponto certo onde finalmente tinham se encontrado. Provavelmente fomos piores cartógrafos da história. Entretanto, percebemos que em certo ponto, as árvores eram muito grossas perto d'água e não fomos capazes de prosseguir. Perdemos o interesse no projeto por um tempo e nossas explorações foram reduzidas significativamente, mesmo que não completamente, quando começamos a vender raspadinhas (N.T: No original, snow cones).

Depois que mostrei todas as Polaroids que tinha trazido da escola para casa para minha mãe, ela confiscou a máquina de raspadinha e nosso interesse nos mapas voltaram. Tivemos que inventar outro plano. Embora eu não entendesse o por quê, minha mãe tinha colocado severas restrições de o que eu podia fazer ou onde podia ir, e tinha que ir de vez em quando para casa para dizer que estava tudo bem se fosse sair para brincar com Josh. Isso significava que não podíamos ficar horas no bosque procurando por um novo caminho. Pensamos em nadar para atravessar parte densa da floresta, mas isso claramente não funcionaria desde que molharíamos o mapa. Tentamos ir mais rápido quando estávamos vindo da casa de Josh, mas acabamos tendo o mesmo problema. Então tivemos uma ideia brilhante.

Teríamos de construir uma jangada.

Por conta das construções no bairro, havia uma grande quantidade materiais de construções não usados que as companhias colocavam dentro da vala para não deixar nas estradas e terrenos, sendo que não seriam mais utilizados. Originalmente, tivemos a ideia de um navio formidável, completo com mastro e âncora, mas rapidamente isso foi mudado para algo bem mais fácil. Deixamos a madeira de lado e pegamos vários pedaços de isopor e placas de espuma sintética e amarramos com cordas e linhas de pipas.

Lançamos nossa embarcação um pouco antes da casa de Sra. Maggie e abanamos adeus enquanto ela fazia sinal para que voltássemos. Mas não tinha como parar.

A jangada funcionou muito bem, e enquanto falávamos e agíamos como se a funcionalidade da jangada fosse garantida, eu fiquei um tanto surpreso. Nós dois tínhamos em mãos galhos longos de árvore para usar como remo, mas descobrimos que usá-los impulsionando a terra por debaixo da água era muito mais fácil do que como antes pretendido. Quando chegamos a uma certa profundidade, simplesmente deitamos de barriga para baixo e usamos as mãos como remos, o que também funcionava - embora não tão bem. Da primeira vez que fizemos isso, lembro-me de pensar que, se alguém visse isso de longe, pareceria um cara muito gordo com braços muitos finos, nadando.

Na verdade, tivemos que fazer várias viagens para chegar com a jangada até a marca mais distante que já tínhamos antes feito. Depois de ter a ideia de marcar o chão com um galho, planejávamos ir até a marcação e então, o mais cuidadosamente possível, mapear nosso curso. Isso significava que o obstáculo estava um pouco distante, então para navegar pelas redondezas da minha casa até o bloqueio no bosque estava levando mais tempo que o esperado. Navegávamos um pouco e aportávamos a jangada, para na próxima vez chegar a pé pelo bosque e ir um pouco mais longe.

Continuamos a fazer isso até o inicio do ano letivo, primeiro ano do fundamental. Josh e eu fomos matriculados em turmas diferentes naquele ano, então, mesmo que não nos encontrássemos durante o dia na escola, nossos pais estavam mais dispostos a deixar-nos sair juntos todos os finais de semana. Além do mais, o pai de Josh estava trabalhando em um projeto que faria com que trabalhasse nos finais de semana e a mãe dele ficava de plantão, o que significava que sábado e domingo ele quase sempre estava na minha casa.

Devíamos estar fazendo um belíssimo progresso, mas quando chegamos ao impasse e tivemos a oportunidade de explorar o lugar, não conseguimos achar um lugar para ancorar. As árvores eram simplesmente grossas demais e a água tinha corroído a terra de tal jeito que em certo ponto havia uma elevação de mais de meio metro que expunha as raízes torcidas e úmidas das árvores logo acima.
Tínhamos que voltar todas as vezes e deixar a jangada no mesmo lugar que nos tinha feito construir a jangada em primeiro lugar. Pior ainda, o inverno tinha chego, então não tínhamos justificativa para sair de casa com nossas roupas de banho; estávamos chegando em lugar nenhum - sempre tínhamos que voltar para casa antes de fazer uma distância maior. 

Em um sábado, por volta das sete da noite, Josh e eu estávamos brincando quando uma das colegas de trabalho da minha mãe bateu na porta do meu quarto. Seu nome era Samantha, e agora lembro-me bem dela, pois eu a pedi em casamento alguns anos depois quando visitando minha mãe no trabalho. Minha mãe disse que teria de ir no trabalho dar um jeito em um problema que tinha surgido e que voltaria em mais ou menos duas horas. O carro estava no conserto, então ela pegaria uma carona com Samantha; mas deduzi que o problema era na verdade culpa de Samantha e  que discutir no carro levaria duas horas. Ela disse que sob nenhuma circunstância deveríamos sair de casa ou abrir a porta para alguém, e estava explicando que iria ligar de hora em hora para ter certeza que estávamos em casa, mas nem terminou a sentença pois lembrou que nosso telefone tinha sido cortado por causa de atrasos no pagamento - Foi por isso que Samantha chegou sem aviso prévio. Ela me olhou bem no fundo dos meus olhos enquanto fechava a porta e disse "Não saia daqui."

Essa era nossa chance.

Vimos as duas saindo de carro pela rua torta, e assim que o carro sumiu de vista corremos para meu quarto. Peguei minha mochila enquanto Josh pegava o mapa.

"Você tem uma lanterna?" Josh perguntou.

"Não, mas nós voltaremos antes do escurecer."

"Eu estava pensando, só para prevenir, devíamos levar uma."

"Minha mãe tem uma, mas não sei onde ela guarda... Espera aí!"

Corri até meu armário e peguei uma caixa da prateleira de cima.

"Você tem uma lanterna aí?" Ele perguntou.

"Não exatamente..."

Abri a caixa e mostrei três sinalizadores que tinha pego da pilha que minha mãe tinha acumulado para o dia 4 de julho do verão passado; junto com um isqueiro que tinha roubado dela alguns meses atrás, isso nos garantiria luz, se precisássemos. Isso foi alguns meses antes de eu começar a temer o bosque durante a noite, então não era o medo que motivava nossa procura por luz - só praticidade. Jogamos tudo dentro da mochila e saímos pela porta de trás, deixando-a fechada para que Caixas não saísse. Tínhamos uma hora e quinze minutos.  

Corremos pelo bosque o mais rápido possível e chegamos na jangada em 15 minutos. Estávamos com nossas roupas de banho por baixo das roupas normais, então tiramos as camisetas e as calças e deixamos em duas pilhas separadas na beira do lago. Desamarramos a jangada da árvore, pegamos nossos galhos-remos e saímos.

Tentamos nos mover rapidamente para ultrapassar o ponto que continha o nosso mapa de continuar, sendo que não tínhamos tempo de ficar observando a vista. Sabíamos que éramos mais lentos na água do que em terra, e que ficaríamos na jangada por um tempo, sendo que o bosque era muito cheio de árvores que ficava impossível de atravessar e não havia lugar para ancorar por perto; nós teríamos de navegar de volta ao ponto de origem mesmo se encontrássemos um lugar mais a frente para ancorar.

Depois de passar pela última parte desenhada em nosso mapa, o lago ficou muito fundo e eventualmente não conseguíamos mais usar os galhos contra o chão, então deitamos de barriga para baixo e começamos a remar com as mãos. O céu estava escurecendo e com resultado disso, ficava difícil distinguir uma árvore da outra, e começamos a ficar levemente nervosos. Com a meta de fazer aquilo o mais rápido possível, estávamos remando rápido com nossos braços, mas isso fazia muito barulho enquanto nossas mãos batiam repetidamente na superfície da água. Enquanto fazíamos isso, podíamos ouvir o esmagar de folhas mortas e galhos pequenos se quebrando no bosque à nossa direita. Quando reduzíamos a quase zero o som de nossas ações, os barulhos paravam e começamos a nos perguntar se realmente tínhamos ouvido alguma coisa em primeiro lugar.  Não tínhamos ideia de que tipos de animais habitavam ali, tão fundo bosque e na verdade nem queríamos descobrir.

Enquanto Josh modificava o mapa que eu estava iluminando com o isqueiro, começamos a perceber que o som não era da nossa imaginação. Ouvimos, rápido e rítmico: passos - estalo - passos.

Parecia estar se movendo a uma certa distância da gente, indo pelo bosque além de nosso mapa. Estava muito escuro para se enxergar qualquer coisa. Tínhamos calculado mal o tempo que o sol ainda ficaria no céu.

Nervoso, falei.

"Olá?"

Houve um momento tenso em que mal conseguimos respirar enquanto imóveis na água. Esse silêncio logo foi quebrado por uma risada.
"Olá?" Josh riu.

"E daí?"

"Olá, Sr. Monstro-no-bosque. Percebi que você anda espiando por aí, mas talvez responda ao meu 'olá'? Olááááááá!"

Percebi o quão estúpido era aquilo. Independente de qualquer animal que fosse, não iria responder. Eu nem percebera o que tinha falado antes, mas se realmente algo estivesse por ali, não haveria resposta.

Josh continuou, "Oláááááá´," em um falsete alto.

"Olááááá," falei em resposta, do jeito mais intenso que pude.

"E aí, companheiro!"

"O-lá. Beep Boop."

"OOOoooOOlÁÁÁáááá"

Continuamos a zombar um do outro e estávamos virando a jangada para voltar quando ouvidos,

"Olá."

Foi sussurrado e forçado como se fosse produzido pelo último suspiro de pulmões enfraquecidos, mas não soou doente. Tinha vindo do lugar que não tínhamos no mapa que, por termos dado a volta, ficava atrás de nós. Lentamente me desloquei na jangada e fiquei de frente à direção de que a voz tinha vindo, enquanto me atrapalhava com o sinalizador. Eu queria ver.

"O que você está fazendo?!" Josh sussurrou.

Mas eu já tinha acendido. Enquanto as faíscas se acendiam, segurei em direção do céu. Nunca tinha acendido um desses antes na minha vida e pensei em um usá-lo como já tinha visto em filmes. Uma esfera verde e brilhante voou em direção às estrelas e, em seguida, rapidamente desapareceu. Baixei meu braço, mirando no horizonte; me lembro que houve várias cores, mas não lembro quantas vezes atirei antes de esgotar a pólvora. Outra esfera iluminada, vermelha agora, voou por cima das árvores, mas mesmo assim não vi nada.

"Vamos embora, cara!" Josh me pressionava, enquanto ele se virava para o caminho de casa e começou a remar desesperadamente.

"Só mais um..."

Baixando meu braço diretamente à floresta na minha frente, outra bola vermelha foi lançada do tubo. Viajou diretamente para floresta à minha reta até que colidiu com uma árvore, fazendo que a luz se espalhasse por um breve momento.

Ainda nada.

Soltei o sinalizador na água e vi mais uma bola de fogo ser engolida pela água e rapidamente morrer. Quando começamos a remar em direção à minha casa, ouvimos um barulho no bosque, alto e indisfarçável. O quebrar de galhos e o pisar em folhar secas sobressaia o som das remadas.

Estava correndo.

No nosso pânico, a jangada estava sacolejando muito e senti uma das cordas afrouxar em meu peito.

"Josh, cuidado!"

Mas era muito tarde. Nossa jangada estava se quebrando. Não muito tempo depois, tinha se desfeito por completo. Nós dois nos seguramos em pedaços separados de isopor, mas esses não eram grandes o suficiente para nos manter completamente fora d'água, e nossas pernas pendiam dentro da água gélida.

"Josh! Rápido!" Gritei enquanto apontava para a água perto dele.

Ele se moveu, mas estava com muito frio para fazer rápido suficiente e vimos o mapa flutuar para longe.

"E-e-estou c-c-com f-f-rio, c-c-cara." Josh estremeceu, desanimado. "V-v-vamos sair d-d-da água."

Nos aproximamos da beira, mas toda vez que tentávamos sair da água ouvíamos barulhos e um farfalhar frenético em direção de nós no bosque logo a frente. Por fim estávamos com tanto frio e muito fracos para se quer tentar mais.

Com um pouco de esforço conseguimos sair da água perto do lugar onde antes tínhamos ancorado a jangada. Soltamos os pedaços da jangada e tentamos puxá-las para terra, mas os pedaços de Josh flutuaram para longe em direção ao lago. Tiramos nossas roupas de banho e estávamos desesperados para ficar secos e sair do frio congelante. Enfiei minha bermuda, mas algo estava errado. Virei para Josh.

"Onde está minha blusa, cara?"

Ele deu os ombros e falou, "Talvez tenha caído na água e flutuado para o lago?"

Falei para Josh correr para minha casa e dizer que estávamos brincando de esconde-esconde caso minha mãe já tivesse chegado. Eu tinha que procurar pela minha blusa.

Corri até as casas e espiei a água observando ao longo da costa. Ocorreu-me que, com um pouco de sorte, talvez pudesse encontrar o mapa também. Me movia muito rápido pois precisava chegar em casa, e estava prestes a desistir quando minha concentração foi interrompida por um som vindo logo atrás de mim.  

"Olá..."

Me virei. Era a Sra. Maggie. Nunca tinha a visto durante a noite antes, e na luz fraca parecia extremamente frágil. O calor que envolvia seu ser normalmente parecia ter sido apagado pelo frio. Não conseguia me lembrar de ter a visto sem um sorriso antes, e por isso seu rosto parecia estranho.

"Olá Sra. Maggie."

"Ah, oi Chris!" O calor em seu sorriso voltou, mesmo que sua mente são não. "Não conseguia ver se era você nessa escuridão."

Brincando, perguntei se ela me convidaria para um lanche, mas ela disse que talvez em outro momento; estava muito ocupado procurando meu mapa e a blusa para realmente interagir, mas ela parecia feliz, então não me senti mal. Ela disse algumas outras coisas, mas prestei pouca atenção por estar distraído. Dei boa noite e corri em direção à calçada perto da minha casa. Atrás de mim eu podia ouvi-la andando na grama congelada, mas não me virei para abanar; tinha que ir para casa.

Cheguei alguns minutos antes de minha mãe e, antes dela entras, já tínhamos trocado de roupa e se esquentado. Tínhamos nos safado, mesmo perdendo o mapa.

"Não conseguiu encontrar?"

"Não, mas encontrei com Sra. Maggie. Ela me chamou de Chris de novo. Tô falando, cara, fique feliz de nunca ter se encontrado com ela a noite."

Nós dois rimos e ele me perguntou se eu não o convidaria para um lanche, brincando que o lanche devia ser terrível desde que ela não conseguia dá-los para ninguém. Contei que dessa vez ela não tinha me convidado e ele ficou surpreso, e agora pensando bem, também fiquei. Literalmente todas as vezes que nos encontramos com ela tínhamos sido convidados para o lanche, sarcasticamente, a única vez que me convidei ela recusou.

Enquanto Josh falava mais da Sra. Maggie, me lembrei que o isqueiro ainda devia estar no meu bolso e que seria desastroso se minha mãe o achasse. Peguei os shorts do chão e procurei em meus bolsos: Senti algo, mas não era o isqueiro. Do meu bolso traseiro tirei um pedaço de papel dobrado e meu coração deu um pulo "O mapa?" Pensei. "Mas eu o vi flutuando para longe". Enquanto desdobrava o papel meu estomago deu uma volta enquanto tentava desvendar o que estava vendo. Desenhando havia dois bonecos de palito segurando as mãos dentro de uma forma oval. Um era muito maior que o outro, mas não tinham rostos. O papel tinha sido rasgado, então um pedaço estava faltando e havia um número escrito no topo direito, bem no canto. Era um "15" ou um "16". Nervoso, mostrei para Josh e perguntei a ele se ele tinha colocado aquilo no meu bolso em algum momento, mas ele zombou da ideia e perguntou porque eu estava tão chateado. Apontei para o boneco de palito menor e o que estava escrito ao seu lado.

Eram minhas iniciais.

Deixei aquilo para lá e contei o resto da conversa entre mim e a Sra. Maggie. Eu sempre tinha atribuído aquela estranha mudança de comportamento por ela estar doente, mas agora, depois de todos esses anos, que repenso nos eventos. Agora enquanto penso nisso, uma profunda tristeza por Sra. Maggie vem a mim, mas é aumentada pela sensação iminente de desespero sobre o porquê ela disse "talvez outra hora". Eu sabia o que ela tinha dito, mas não tinha entendido naquela noite. Não tinha entendido suas palavras mesmo quando semanas depois, assisti homens estranhos usando uniformes laranjas de isolamento bioquímico carregando o que eu achava ser grandes sacolas de lixo da casa dela, ou porque todo o bairro cheirava a morte naquele dia. Ainda não tinha entendido quando eles condenaram a casa e a cercaram um pouco antes de nos mudarmos. Mas agora entendo. Entendo porque suas últimas palavras à mim eram tão importantes, mesmo que nem ela nem eu percebemos na época.

Sra. Maggie tinha me dito que Tom havia voltado para casa, mas agora sei quem tinha realmente se mudado para lá; assim como eu sei porque nunca vi seu corpo sendo carregado em uma maca.


As sacolas não estavam cheias de lixo. 

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